Carolina Maria de Jesus (1914-1977) foi uma mulher negra, brasileira, favelada e apaixonada pelas letras. Muito humilde e com pouca instrução, lia com frequência e, enquanto escrevia os seus diários, alimentava o sonho de ser escritora.
Descoberta por um jornalista - que a apoiou na publicação dos seus manuscritos - Carolina de Jesus viu seus diários se tornarem Quarto de despejo: diário de uma favelada, um campeão de vendas traduzido para 13 idiomas.
Carolina Maria de Jesus nasceu no dia 14 de março de 1914, em Sacramento, município de Minas Gerais. Na infância, era conhecida como Bitita.
Muito humilde, a mãe trabalhava como lavadeira, e com o auxílio de sua patroa, Carolina frequentou o Colégio Allan Kardec até o 2º ano do ensino fundamental.
Mudou-se para São Paulo, onde foi viver na favela do Canindé, localizada às margens do rio Tietê.
Empregada na casa de um médico e, apaixonada pelos livros, utilizava a biblioteca particular do patrão. Posteriormente, trabalhou como lavadeira e catadora. Enquanto catadora, além de tirar proveito de tudo o que pudesse para a sua sobrevivência e a dos filhos, recolhia livros e cadernos do lixo.
Assim, Carolina tinha acesso aos livros, que mais tarde deixarão sua marca no vocabulário rebuscado que utilizava nos seus manuscritos.
Carolina teve três filhos com pais diferentes - João José de Jesus, José Carlos de Jesus e Vera Eunice de Jesus Lima - e os criou sozinha. Mas, mesmo com uma rotina muito pesada, lia e escrevia com frequência o que vivia no seu cotidiano na favela, registrando tudo em forma de diário, nos cadernos que encontrava no lixo.
Esses registros renderam-lhe vinte cadernos, alguns dos quais que viriam a ser publicados em um livro que se tornaria um grande sucesso.
Tudo aconteceu quando, em decorrência de uma reportagem na favela do Canindé, o jornalista Audálio Dantas conheceu Carolina, que lhe mostrou os seus cadernos. Impressionado com o material que tinha em mãos, organizou e revisou os manuscritos, ajudando a publicá-lo em 1960.
Na altura, houve quem especulasse a autoria dos manuscritos. O jornalista explicou que o seu trabalho teria sido corrigir a pontuação e omitir muitas repetições no texto, tal como o de muitos registros mencionando a fome que passavam, situação que era bastante frequente.
O livro chamou a atenção do mundo literário e apenas a sua primeira edição rendeu a venda de 30 mil exemplares.
Depois desse sucesso, outros livros foram publicados, mas sem o mesmo êxito. E dezessete anos depois da publicação do seu primeiro livro, no dia 13 de fevereiro de 1977, Carolina morreu quase esquecida num sítio da periferia de São Paulo.
Nos últimos anos, a vida e obra de Carolina tem sido objeto de estudo, o que voltou a dar visibilidade à escritora. Nesse seguimento, a biblioteca do Museu Afro-Brasil, localizada no Parque Ibirapuera - inaugurado em 2000 - recebeu o nome de Carolina Maria de Jesus.
Quarto de despejo: diário de uma favelada é, sem dúvida, o grande sucesso de Carolina Maria de Jesus. Traduzida para 13 idiomas, a obra relata o cotidiano de Carolina, moradora de uma favela em São Paulo na década de 50.
Nos cadernos que juntava do lixo, Carolina escrevia o seu dia-a-dia. Dificuldades diárias para garantir comida, preconceito racial, problemas com vizinhos e com a educação dos filhos. Várias passagens do livro, escrito com linguagem simples, dão conta dessa realidade, cuja obra assume um papel importante como crítica social.
Em 1948, quando começaram a demolir as casas térreas para construir os edifícios, nós, os pobres que residíamos nas habitações coletivas, fomos despejados e ficamos residindo debaixo das pontes. É por isso que eu denomino que a favela é o quarto de despejo de uma cidade. Nós, os pobres, somos os trastes velhos.
Quarto de despejo contempla as suas vivências entre 15 de julho de 1955 e 1 de janeiro de 1960. Mas há saltos na obra, ou seja, o livro não contém cada uma das datas ao longo desses anos, o que resultou da revisão feita para sua publicação, quando o jornalista Audálio Dantas retirou as partes cujo assunto se repetia, tal como o problema da fome que enfrentavam quase todos os dias.
Mesmo com suas limitações - nas faltas de acento ou nos erros de concordância - a obra é um destaque pelo que transmite sobre a vivência numa favela. Ninguém fora dessa condição teria alcançado um resultado melhor.
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