Carolina Maria de Jesus (1914-1977) foi uma escritora brasileira negra, autora de Quarto de despejo: diário de uma favelada, obra publicada em 1960.
Carolina de Jesus era catadora de lixo e tinha pouca instrução, mas era apaixonada pelas letras e lia com frequência. Moradora de uma favela em São Paulo, escrevia diários que contavam o seu dia a dia, até que foi descoberta por um jornalista que a apoio na publicação dos seus manuscritos.
Esses manuscritos se tornaram Quarto de despejo: diário de uma favelada, um campeão de vendas traduzido para vários idiomas, porque mesmo com suas limitações - na falta de pontuação e erros gráficos em algumas palavras - a obra se destacou pelo que transmitiu sobre a vivência numa favela.
Depois do sucesso de Quarto de Despejo, a escritora não teve êxito com os outros livros que escreveu, e morreu quase esquecida.
Nos últimos anos, a vida e obra de Carolina tem sido objeto de estudo, o que voltou a dar visibilidade à escritora. Nesse seguimento, a biblioteca do Museu Afro-Brasil, localizada no Parque Ibirapuera - inaugurado em 2000 - recebeu o nome de Carolina Maria de Jesus.
Quarto de despejo: diário de uma favelada é, sem dúvida, o grande sucesso de Carolina Maria de Jesus. Traduzida para treze idiomas, a obra relata o cotidiano de Carolina, moradora de uma favela em São Paulo na década de 50.
O livro surgiu a partir da edição dos vinte cadernos que Carolina escrevia todos os dias. Nesses cadernos, a autora conta dificuldades diárias para garantir comida, preconceito racial, problemas com vizinhos e também com a educação dos três filhos.
Várias passagens do livro, escrito com linguagem simples, dão conta dessa realidade, cuja obra assume um papel importante como crítica social.
Quarto de despejo contempla as vivências de Carolina entre 15 de julho de 1955 e 1 de janeiro de 1960. Mas há saltos na obra, ou seja, o livro não contém cada uma das datas ao longo desses anos. Tais saltos são resultado da revisão feita pelo jornalista Audálio Dantas para sua publicação, que retirou as partes dos assuntos que eram repetitivos, tal como a fome.
A fome era um problema enfrentado diariamente, que incomodava muito Carolina e, por isso, ela escrevia. Nas palavras da autora, que chegou a firmar na obra que sabia que a cor da fome era amarela, Carolina diz que
Quando eu não tinha nada o que comer, em vez de xingar eu escrevia.
Assim, para não tornar o livro tão repetitivo, Audálio cortou algumas partes do texto, tal como as que falam da fome.
Entre tantas dificuldades, a convivência com os vizinhos não era muito agradável. Ela era criticada por ser mãe solteira, mas sentia-se com sorte por não ter marido, uma vez que presenciava muitas brigas entre marido e mulher violentas. Carolina não gostava nada de que os filhos vivessem nesse ambiente.
Quarto de Despejo conta com os seguintes personagens:
O título do livro expressa o que Carolina sentiu quando as habitações coletivas onde vivia foram demolidas para que fossem construídos prédios. Despejada para ir viver debaixo da ponte, Quarto de Despejo significa que a favela é o quarto de despejo de uma cidade, nas palavras da autora:
Em 1948, quando começaram a demolir as casas térreas para construir os edifícios, nós, os pobres que residíamos nas habitações coletivas, fomos despejados e ficamos residindo debaixo das pontes. É por isso que eu denomino que a favela é o quarto de despejo de uma cidade. Nós, os pobres, somos os trastes velhos.
Quarto de Despejo apresenta erros de concordância, palavras com falta de acentos, mas também muitas palavras rebuscadas, que a autora aprendeu através da rotina de leituras que tinha.
Mesmo com suas limitações, a obra é um destaque pelo que transmite sobre a vivência numa favela. Ninguém fora dessa condição teria alcançado um resultado melhor.
Carolina Maria de Jesus nasceu no dia 14 de março de 1914, em Sacramento, município de Minas Gerais. Na infância, era conhecida como Bitita.
Muito humilde, a mãe trabalhava como lavadeira, e com o auxílio de sua patroa, Carolina frequentou o Colégio Allan Kardec até o segundo ano da escola primária.
Mudou-se para São Paulo, onde foi viver na favela do Canindé, localizada às margens do rio Tietê.
Empregada na casa de um médico e, apaixonada pelos livros, utilizava a biblioteca particular do patrão. Tempos depois, trabalhou como lavadeira e catadora de papel e de outros tipos de lixo.
Enquanto catadora, além de tirar proveito de tudo o que pudesse para a sua sobrevivência e a dos filhos, recolhia livros e cadernos do lixo.
Assim, Carolina tinha acesso aos livros, que mais tarde deixarão sua marca no vocabulário rebuscado que utilizava nos seus manuscritos.
Carolina teve três filhos com pais diferentes - João José de Jesus, José Carlos de Jesus e Vera Eunice de Jesus Lima - e os criou sozinha. O primeiro era filho de um marinheiro português; o segundo, filho de um espanhol, e a menina, filha de um comerciante.
Mesmo com uma rotina muito pesada, Carolina lia e escrevia com frequência o que vivia no seu cotidiano na favela, registrando tudo em forma de diário, nos cadernos que encontrava no lixo.
Esses registros renderam-lhe vinte cadernos, alguns dos quais que viriam a ser publicados em um livro, Quarto de despejo: diário de uma favelada, que se tornaria um grande sucesso.
Tudo aconteceu quando, em decorrência de uma reportagem na favela do Canindé, o jornalista Audálio Dantas conheceu Carolina, que lhe mostrou os seus cadernos. Impressionado com o material que tinha em mãos, organizou e revisou os manuscritos, ajudando a publicá-lo em 1960.
Na altura, houve quem especulasse a autoria dos manuscritos. O jornalista explicou que o seu trabalho teria sido corrigir a pontuação, corrigir a grafia de algumas palavras e omitir muitas repetições no texto, tal como o de muitos registros mencionando a fome que passavam, situação que era bastante frequente.
O livro chamou a atenção do mundo literário e apenas a sua primeira edição rendeu a venda de 30 mil exemplares.
Carolina ficou famosa e ganhou algum dinheiro, mas não enriqueceu. Seus conhecidos da favela achavam que ela tinha ficado rica e pediam-lhe dinheiro, e não devolviam depois.
Antes disso, ela já havia pedido a uma editora nos Estados Unidos que publicasse os seus escritos em troca de condições básicas de vida, uma casa para viver com seus filhos e comida. No entanto, os manuscritos enviados foram devolvidos.
Depois desse sucesso, outros livros foram publicados, mas sem o mesmo êxito. E dezessete anos depois da publicação do seu primeiro livro, no dia 13 de fevereiro de 1977, Carolina morreu quase esquecida num sítio da periferia de São Paulo, onde vivia. Tinha 63 anos.
No mesmo ano da morte de Carolina, seu filho mais velho - que era muito doente - também morreu. Em 2016, o filho do meio morreu atropelado.
Vera Eunice, a filha mais nova de Carolina, tornou-se professora, que era o sonho de sua mãe para Vera. Antes de morrer, Carolina entregou uma carta à filha pedindo que ela divulgasse o seu nome.
Nos últimos anos, a vida e obra de Carolina tem sido objeto de estudo, o que voltou a dar visibilidade à escritora. Nesse seguimento, a biblioteca do Museu Afro-Brasil, localizada no Parque Ibirapuera - inaugurado em 2000 - recebeu o nome de Carolina Maria de Jesus.
Poeta, em que medita? Por que vives triste assim? É que eu a acho bonita E você não gosta de mim. Poeta, tua alma é nobre És triste, o que o desgosta? Amo-a. Mas sou tão pobre E dos pobres ninguém gosta. Poeta, fita o espaço E deixa de meditar. É que... eu quero um abraço E você persiste em negar. Poeta, está triste eu vejo Por que cisma tanto assim? Queria apenas um beijo Não deu, não gosta de mim. Poeta! Não queixas suas aflições Aos que vivem em ricas vivendas Não lhe darão atenções Sofrimentos, para eles, são lendas.
Carolina Maria de Jesus
Eu sou a flor mais formosa Disse a rosa Vaidosa! Sou a musa do poeta.
Por todos su contemplada E adorada.
A rainha predileta. Minhas pétalas aveludadas São perfumadas E acariciadas.
Que aroma rescendente: Para que me serve esta essência, Se a existência Não me é concernente…
Quando surgem as rajadas Sou desfolhada Espalhada Minha vida é um segundo. Transitivo é meu viver De ser… A flor rainha do mundo.
Carolina Maria de Jesus
Sonhei que estava morta Vi um corpo no caixão Em vez de flores eram Iivros Que estavam nas minhas mãos Sonhei que estava estendida No cimo de uma mesa Vi o meu corpo sem vida Entre quatro velas acesas
Ao lado o padre rezava Comoveu-me a sua oração Ao bom Deus ele implorava Para dar-me a salvação Suplicava ao Pai Eterno Para amenizar o meu sofrimento Não me enviar para o inferno Que deve ser um tormento
Ele deu-me a extrema-unção Quanta ternura notei Quando foi fechar o caixão Eu sorri… e despertei.
Carolina Maria de Jesus
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