Variações linguísticas são o resultado das mudanças constantes da língua, que envolvem fatores geográficos, sociais, profissionais e situacionais.
1. (Enem)
De domingo
— Outrossim? — O quê? — O que o quê? — O que você disse. — Outrossim? — É. — O que que tem? — Nada. Só achei engraçado. — Não vejo a graça. — Você vai concordar que não é uma palavra de todos os dias. — Ah, não é. Aliás, eu só uso domingo. — Se bem que parece uma palavra de segunda-feira. — Não. Palavra de segunda-feira é "óbice". — “Ônus". — “Ônus” também. “Desiderato”. “Resquício”. — “Resquício” é de domingo. — Não, não. Segunda. No máximo terça. — Mas “outrossim”, francamente… — Qual o problema? — Retira o “outrossim”. — Não retiro. É uma ótima palavra. Aliás, é uma palavra difícil de usar. Não é qualquer um que usa “outrossim”.
(VERÍSSIMO. L.F. Comédias da vida privada. Porto Alegre: LP&M, 1996)
No texto, há uma discussão sobre o uso de algumas palavras da língua portuguesa. Esse uso promove o(a)
a) marcação temporal, evidenciada pela presença de palavras indicativas dos dias da semana. b) tom humorístico, ocasionado pela ocorrência de palavras empregadas em contextos formais. c) caracterização da identidade linguística dos interlocutores, percebida pela recorrência de palavras regionais. d) distanciamento entre os interlocutores, provocado pelo emprego de palavras com significados poucos conhecidos. e) inadequação vocabular, demonstrada pela seleção de palavras desconhecidas por parte de um dos interlocutores do diálogo.
Ver RespostaAlternativa correta: b) tom humorístico, ocasionado pela ocorrência de palavras empregadas em contextos formais.
a) ERRADA. É certo que no texto são sugeridos dias da semana para utilizar certas palavras, mas essa não é uma questão relevante no que respeita à variação linguística. Em termos temporais, o desenvolvimento histórico da língua é o que importa para essa temática, cujo tipo de variação é identificada como Variação histórica ou diacrônica — o português arcaico, por exemplo.
b) CORRETA. O texto gira em torno de uma conversa informal, em que se discute o uso de palavras utilizadas em contextos formais. O humor decorre justamente desse contraste das palavras que são usadas segundo o campo de atuação — situações formais e informais, que em linguística é definida como Variação situacional ou diafásica.
c) ERRADA. Não há no texto a presença de regionalismos, tipo de variação linguística caracterizada como Variação geográfica ou diatópica — diferenças entre português do Brasil e de Portugal, por exemplo.
d) ERRADA. A discussão do texto não evidencia distanciamento dos interlocutores, afinal, ao discutir em que dia da semana devem usar certas palavras, ambos mostram aparentemente conhecê-las.
e) ERRADA. Ambos os interlocutores parecem conhecer as palavras, de tal modo que o texto se desenvolve numa conversa acerca do dia da semana em que as mesmas devem ser utilizadas. Não há, assim, inadequação vocabular, a não ser pelo fato de serem citadas palavras utilizadas em discursos formais na conversa que ocorre informalmente, mas isso promove justamente o tom humorístico do texto, motivo pelo qual a alternativa b) é a correta.
VEJA TAMBÉM: Linguagem Formal e Informal2. (Enem)
Mandinga — Era a denominação que, no período das grandes navegações, os portugueses davam à costa ocidental da África. A palavra se tornou sinônimo de feitiçaria porque os exploradores lusitanos consideram bruxos os africanos que ali habitavam — é que eles davam indicações sobre a existência de ouro na região. Em idioma nativo, mandinga designava terra de feiticeiros. A palavra acabou virando sinônimo de feitiço, sortilégio.
(COTRIM, M. O pulo do gato 3. São Paulo: Geração Editorial, 2009. Fragmento)
No texto, evidencia-se que a construção do significado da palavra mandinga resulta de um(a)
a) contexto sócio-histórico. b) diversidade técnica. c) descoberta geográfica. d) apropriação religiosa. e) contraste cultural.
Ver RespostaAlternativa correta: a) contexto sócio-histórico.
a) CORRETA. O texto é marcado por um tipo de variação linguística identificado como Histórica ou Diacrônica. Esse tipo de variação é marcado pelo desenvolvimento da língua ao longo do tempo, tal como o que aconteceu com o português medieval até o português atual. O texto mostra como a palavra "mandinga" era designada ("Era a denominação..."), como foi sendo modificada ("A palavra se tornou (...) porque (...)") e como se tornou ("A palavra acabou virando...").
b) ERRADA. A variação linguística pode ser marcada por aspectos sociais, de acordo com os grupos sociais envolvidos. Exemplo disso é a linguagem técnica utilizada entre profissionais, que muitas vezes não é perceptível fora desse grupo. A palavra "mandinga", no entanto, não é uma palavra técnica utilizada entre navegadores, mas foi criada e modificada ao longo do tempo, tal como o texto explica que pelo fato de "(designar) terra de feiticeiros. (...) acabou virando sinônimo de feitiço, sortilégio.".
c) ERRADA. A palavra "mandinga" tinha um significado que foi modificado ao longo do tempo, motivo pelo qual a sua construção não resulta da descoberta geográfica, mas sim do seu contexto sócio-histórico, tal como consta no texto: "Em idioma nativo, mandinga designava terra de feiticeiros. A palavra acabou virando sinônimo de feitiço, sortilégio.".
d) ERRADA. O fato de a palavra ter assumido o sinônimo de feitiçaria, não quer dizer que a palavra "mandinga" tenha sido apropriada por aspectos religiosos. O texto indica que a construção da palavra resulta de questão histórica, uma vez que menciona o que ela designava na altura e qual o seu significado hoje.
e) ERRADA. Apesar de o texto indicar o contraste cultural entre lusitanos e africanos, não é essa a questão que evidencia a construção da palavra "mandinga". O texto permite perceber que o significado da palavra decorre de aspecto histórico, evidenciado pelo seguinte trecho: "Em idioma nativo, mandinga designava terra de feiticeiros. A palavra acabou virando sinônimo de feitiço, sortilégio.".
VEJA TAMBÉM: Variações Linguísticas3. (Enem)
Palavras jogadas fora
Quando criança, convivia no interior de São Paulo com o curioso verbo pinchar e ainda o ouço por lá esporadicamente. O sentido da palavra é o de “jogar fora” (pincha fora essa porcaria) ou “mandar embora” (pincha esse fulano daqui). Teria sido uma das muitas palavras que ouvi menos na capital do estado e, por conseguinte, deixei de usar. Quando indago às pessoas se conhecem esse verbo, comumente escuto respostas como “minha avó fala isso”. Aparentemente, para muitos falantes, esse verbo é algo do passado, que deixará de existir tão logo essa geração antiga morrer.
As palavras são, em sua grande maioria, resultados de uma tradição: elas já estavam lá antes de nascermos. “Tradição”, etimologicamente, é o ato de entregar, de passar adiante, de transmitir (sobretudo valores culturais). O rompimento da tradição de uma palavra equivale à sua extinção. A gramática normativa muitas vezes colabora criando preconceitos, mas o fator mais forte que motiva os falantes a extinguirem uma palavra é associar a palavra, influenciados direta ou indiretamente pela visão normativa, a um grupo que julga não ser o seu. O pinchar, associado ao ambiente rural, onde há pouca escolaridade e refinamento citadino, está fadado à extinção?
É louvável que nos preocupemos com a extinção das ararinhas-azuis ou dos micos-leão-dourados, mas a extinção de uma palavra não promove nenhuma comoção, como não nos comovemos com a extinção de insetos, a não ser dos extremamente belos. Pelo contrário, muitas vezes a extinção das palavras é incentivada.
VIARO, M. E. Língua Portuguesa, n. 77, mar. 2012 (adaptado)
A discussão empreendida sobre o (des)uso do verbo “pinchar” nos traz uma reflexão sobe a linguagem e seus usos, a partir da qual compreende-se que
a) as palavras esquecidas pelos falantes devem ser descartadas dos dicionários, conforme sugere o título. b) o cuidado com espécies animais em extinção é mais urgente do que a preservação de palavras. c) o abandono de determinados vocábulos está associado a preconceitos socioculturais. d) as gerações têm a tradição de perpetuar o inventário de uma língua. e) o mundo contemporâneo exige a inovação do vocabulário das línguas.
Ver RespostaAlternativa correta: c) o abandono de determinados vocábulos está associado a preconceitos socioculturais.
a) ERRADA. O autor entende que as palavras são "resultados de uma tradição" e que assim, não podem deixar de ser transmitidas. Ele critica o fato de permitirmos que palavras sejam extintas, chamando o leitor para a seguinte reflexão: "É louvável que nos preocupemos com a extinção das ararinhas-azuis ou dos micos-leão-dourados, mas a extinção de uma palavra não promove nenhuma comoção (...). Pelo contrário, muitas vezes a extinção das palavras é incentivada.".
b) ERRADA. O autor compara a extinção dos animais com o (des)uso das palavras, alertando o leitor para a sua importância: "É louvável que nos preocupemos com a extinção das ararinhas-azuis ou dos micos-leão-dourados, mas a extinção de uma palavra não promove nenhuma comoção (...). Pelo contrário, muitas vezes a extinção das palavras é incentivada.".
c) CORRETA. A questão do preconceito sociocultural está evidenciada no segundo parágrafo: "A gramática normativa muitas vezes colabora criando preconceitos (...). O pinchar, associado ao ambiente rural, onde há pouca escolaridade e refinamento citadino, está fadado à extinção?".
d) ERRADA. O texto indica que as palavas, assim como as tradições, devem ser transmitidas, no entanto, ambas podem extinguir-se em função do seu (des)uso, ou seja elas não duram para sempre. No que respeita ao verbo "pinchar", o autor informa "Aparentemente, para muitos falantes, esse verbo é algo do passado, que deixará de existir tão logo essa geração antiga morrer.".
e) ERRADA. De acordo com o autor não é o mundo contemporâneo que exige a inovação do vocabulário, mas sim que a extinção das palavras decorre de preconceitos, cuja crítica é o tema central do texto: "O pinchar, associado ao ambiente rural, onde há pouca escolaridade e refinamento citadino, está fadado à extinção?".
VEJA TAMBÉM: Preconceito Linguístico4. (Fuvest)
“A correção da língua é um artificialismo, continuei episcopalmente. O natural é a incorreção. Note que a gramática só se atreve a meter o bico quando escrevemos. Quando falamos, afasta-se para longe, de orelhas murchas.”
LOBATO, Monteiro, Prefácios e entrevistas.
a) Tendo em vista a opinião do autor do texto, pode-se concluir corretamente que a língua falada é desprovida de regras? Explique sucintamente. b) Entre a palavra “episcopalmente” e as expressões “meter o bico” e “de orelhas murchas”, dá-se um contraste de variedades linguísticas. Substitua as expressões coloquiais, que aí aparecem, por outras equivalentes, que pertençam à variedade padrão.
Ver Respostaa) A língua é regida por regras. O que acontece é que a linguagem escrita exige um texto adequado ao seu contexto e o mesmo acontece com a linguagem oral, muitas vezes mais informal.
Por isso, o fato de se adaptar aos seus contextos não deve ser visto como desprestígio. As variações linguísticas existem e enriquecem culturalmente uma língua, de modo que não podem ser considerada uma forma errada de expressão.
A escrita de Monteiro Lobato, por exemplo, valoriza a oralidade, uma vez que ele aproxima a sua literatura do público infantil. Para ter o efeito que desejava, Lobato não deixou de escrever da forma como as pessoas se expressam oralmente, acreditando no enriquecimento cultural inerente às variações linguísticas.
b) “A correção da língua é um artificialismo, continuei episcopalmente. O natural é a incorreção. Note que a gramática só se atreve a palpitar quando escrevemos. Quando falamos, afasta-se para longe, de forma oprimida.”
VEJA TAMBÉM: Oralidade e Escrita5.
A língua sem erros
Nossa tradição escolar sempre desprezou a língua viva, falada no dia a dia, como se fosse toda errada, uma forma corrompida de falar “a língua de Camões”. Havia (e há) a crença forte de que é missão da escola “consertar” a língua dos alunos, principalmente dos que frequentam a escola pública. Com isso, abriu-se um abismo profundo entre a língua (e a cultura) própria dos alunos e a língua (e a cultura) própria da escola, uma instituição comprometida com os valores e as ideologias dominantes. Felizmente, nos últimos 20 e poucos anos, essa postura sofreu muitas críticas e cada vez mais se aceita que é preciso levar em conta o saber prévio dos estudantes, sua língua familiar e sua cultura característica, para, a partir daí, ampliar seu repertório linguístico e cultural.
BAGNO, Marcos. A língua sem erros. Disponível em: http://marcosbagno.files.wordpress.com. Acesso em: 5 nov. 2014.
De acordo com a leitura do texto, a língua ensinada na escola
a) ajuda a diminuir o abismo existente entre a cultura das classes consideradas hegemônicas e das populares. b) deve ser banida do ensino contemporâneo, que procura basear-se na cultura e nas experiências de vida do aluno. c) precisa enriquecer o repertório do aluno, valorizando o seu conhecimento prévio e respeitando a sua cultura de origem. d) tem como principal finalidade cercear as variações linguísticas que comprometem o bom uso da língua portuguesa. e) torna-se, na contemporaneidade, o grande referencial de aprendizagem do aluno, que deve valorizá-la em detrimento de sua variação linguística de origem.
Alternativa correta: c) precisa enriquecer o repertório do aluno, valorizando o seu conhecimento prévio e respeitando a sua cultura de origem.
Ver Respostaa) ERRADA. Ainda que a postura esteja mudando relativamente às variações linguísticas, ainda existe preconceito linguístico na escola no que respeita à linguagem das classes dominantes e a linguagem das classes populares.
b) ERRADA. A norma-padrão é uma competência muito importante para a comunicação. O fato de a escola ensinar dessa forma não pode limitar o entendimento de que a língua está em constante evolução e que as variações linguísticas são culturalmente enriquecedoras e, por isso, tê o seu prestígio.
c) CORRETA. Para Bagno, as variações linguísticas merecem ser prestigiadas, tal como o excerto mostra: "(...) é preciso levar em conta o saber prévio dos estudantes, sua língua familiar e sua cultura característica, para, a partir daí, ampliar seu repertório linguístico e cultural.".
d) ERRADA. A afirmação que consta nesta alternativa é contrária às afirmações de Bagno relativamente às variações linguísticas, que acredita na importância de abrir espaço para o repertório dos alunos e, a partir dele, torná-lo mais amplo.
e) ERRADA. Para o linguista Marcos Bagno, valorizar o repertório linguístico dos alunos é a forma mais adequada de ampliá-lo.
VEJA TAMBÉM: Diferença entre língua e linguagem: entenda de uma vez!6. (Unicamp) No dia 21 de setembro de 2015, Sérgio Rodrigues, crítico literário, comentou que apontar um erro de português no título do filme Que horas ela volta? “revela visão curta sobre como a língua funciona”. E justifica:
“O título do filme, tirado da fala de um personagem, está em registro coloquial. Que ano você nasceu? Que série você estuda? e frases do gênero são familiares a todos os brasileiros, mesmo com alto grau de escolaridade. Será preciso reafirmar a esta altura do século 21 que obras de arte têm liberdade para transgressões muito maiores?
Pretender que uma obra de ficção tenha o mesmo grau de formalidade de um editorial de jornal ou relatório de firma revela um jeito autoritário de compreender o funcionamento não só da língua, mas da arte também.”
(Adaptado do blog Melhor Dizendo. Post completo disponível em http:// www melhordizendo.com/a-que-horas-ela-volta-em-que-ano-estamos-mesmo/. Acessado em 08/06/2016.)
Entre os excertos de estudiosos da linguagem reproduzidos a seguir, assinale aquele que corrobora os comentários do post.
a) Numa sociedade estruturada de maneira complexa a linguagem de um dado grupo social reflete-o tão bem como suas outras formas de comportamento. (Mattoso Câmara Jr., 1975, p. 10.) b) A linguagem exigida, especialmente nas aulas de língua portuguesa, corresponde a um modelo próprio das classes dominantes e das categorias sociais a elas vinculadas. (Camacho, 1985, p. 4.) c) Não existe nenhuma justificativa ética, política, pedagógica ou científica para continuar condenando como erros os usos linguísticos que estão firmados no português brasileiro. (Bagno, 2007, p. 161.) d) Aquele que aprendeu a refletir sobre a linguagem é capaz de compreender uma gramática – que nada mais é do que o resultado de uma (longa) reflexão sobre a língua. (Geraldi, 1996, p. 64.)
Ver RespostaAlternativa correta: c) Não existe nenhuma justificativa ética, política, pedagógica ou científica para continuar condenando como erros os usos linguísticos que estão firmados no português brasileiro. (Bagno, 2007, p. 161.)
a) ERRADA. O excerto de Mattoso Câmara trata de um dos tipos de variações linguísticas — a Variação social ou diastrática, cujos falantes entendem-se em virtude do meio a que pertencem. Exemplo disso é a linguagem técnica utilizada entre os médicos, cujo vocabulário muitas vezes é incompreensível entre os pacientes.
b) ERRADA. O excerto de Camacho critica o fato de que nas aulas de língua portuguesa geralmente apenas a língua normatizada seja considerada correta e, logo, superior, não havendo abertura para refletir no enriquecimento cultural promovido por outras formas de linguagem.
c) CORRETA. O excerto de Bagno critica a visão limitada acerca da língua, em que as variações linguísticas são desprestigiadas; donde surge o preconceito linguístico. Tanto o comentário do enunciado acima como a citação de Bagno contemplam a Variação situacional ou diafásica, a qual entende que a linguagem depende de contextos, que é o que acontece quando um falante muda o seu discurso diante de situações formais e informais.
d) ERRADA. O excerto de Geraldi é uma reflexão acerca da complexidade da língua. O estudo da gramática vai além da memorização de regras, mas do entendimento da língua, que se encontra em evolução constante.
VEJA TAMBÉM: Linguagem Coloquial Márcia Fernandes Professora, pesquisadora, produtora e gestora de conteúdos on-line. Licenciada em Letras pela Universidade Católica de Santos.Show life that you have a thousand reasons to smile
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