O conto “Antes do baile verde”, de Lygia Fagundes Teles, aborda uma temática já expressa numa afirmação da autora numa entrevista, quando indagada se concordava que sua obra expressava uma visão desencantada das coisas. Ela afirma ter fascinação sobre temas como “a loucura; a luta do homem, seus medos e fragilidade, seus sofrimentos e solidão; o amor; a morte”.
* imagem meramente ilustrativa. | |
Editora: | Companhia das Letras |
Autor: | Lygia Fagundes Telles |
ISBN: | 9788535914313 |
Origem: | Nacional |
Ano: | 2009 |
Edição: | 1ª |
Número de páginas: | 208 |
Acabamento: | Brochura |
No desenrolar da narrativa aparece o “problema” que vai ser a causa da discussão entre as duas personagens: a simples afirmação “ele está morrendo”, feita pela empregada. A partir daí, mediante falas fragmentadas, o leitor vai enlaçando os fios onde a história é tecida: o pai de Tatisa é um idoso, de 66 anos, que sofre de uma doença incurável, em fase terminal. A discussão gera em torno do atraso ao baile e de quem ficará com o idoso doente, mas não numa seqüência linear. Entre uma discussão e outra, relembram os outros bailes, mas de repente as personagens retomam a discussão novamente.
Essa fuga da realidade, apresentada no conto sob a constante mudança de assunto, a empolgação para cair na folia, não quer dizer que Tatisa não aceita o fato de o pai estar morrendo. Na realidade, a empolgação com a fantasia “verde” é uma forma de perder a identidade, desobrigando assim Tatisa de desempenhar o papel social de filha que, num momento desses, espera-se que esteja aflita no leito de morte do pai.
Há uma forte simbologia entre o papel assumido pelas duas personagens neste conto. Lu mantém uma postura racional perante o problema, aconselhando Tatisa a esquecer o baile e tomar conta do pai moribundo. Já Tatisa mantém uma postura, por assim dizer, irresponsável, mais ligada ao instinto que à razão. O caráter simbólico de Lu pode ser tomado pela própria consciência de Tatisa, representando assim a luta travada entre a razão e o instinto, escolher entre o certo (pensar no outro, neste caso, o pai) e o prazeroso (buscar seu próprio bem-estar, atitude egoísta).
“Aquele médico miserável. Tudo culpa daquela bicha. Eu bem disse que não podia ficar com ele aqui em casa, eu disse que não sei tratar de doente, não tenho jeito, não posso! Se você fosse boazinha, você me ajudava, mas você não passa de uma egoísta, uma chata que não quer saber de nada. Sua egoísta.”
Além desta simbologia, o conto apresenta outros contrastes simbólicos em sua construção. O ambiente opressivo da casa, marcado pela presença iminente da “morte” contrasta com o ambiente festivo e movimentado da rua, que representa uma oportunidade de fuga da realidade para as personagens em busca do prazer carnal. É tanto que Tatisa reclama o tempo todo do calor sufocante e da sede, recorrendo ao uísque e à janela para tomar fôlego, pretexto para fugir desse ambiente funesto.
O desfecho deste conto não é previsível. O leitor espera que Tatisa desista do baile e faça companhia ao pai, como se esperaria que uma filha fizesse. No entanto, a personagem evita entrar no quarto, com medo de que o pai esteja morto e isso atrapalhe o baile. Tudo o que ela quer é que a empregada cuide do pai ao menos naquele dia, para que possa se divertir.
As personagens não têm coragem de espiar o enfermo. Lu solta a mão de Tatisa e sai de fininho, enlevada pelo som das buzinas na rua. Tatisa, apavorada pelo “poderoso som do relógio”, sai correndo em direção à empregada, chamando aflitamente por ela. Uma imagem simbólica desfecha o conto: “apoiada pelo corrimão, colada a ele, desceu precipitadamente. Quando bateu a porta atrás de si, rolaram pela escada algumas lantejoulas verdes na mesma direção, como se quisessem alcançá-las”. O ambiente estava tão sombrio, sinistro, que até as lantejoulas caídas da fantasia de Tatisa rolam escada abaixo, também querendo fugir daquele ambiente funesto.
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