A deslexicalização é o nome do processo em que um vocábulo se desassocia do léxico, ou seja, tem o sentido social comum mudado.
Esse significado pode ser evidenciado pelo prefixo de origem latina “des”, que indica uma ação contrária a do elemento ao qual ele está relacionado.
Para Castilho (2010, p. 117), a deslexicalização pode ser definida como a morte das palavras.
O nosso léxico é, a grosso modo, um grande dicionário mental em que as palavras com que temos contato são registradas e podem ser acessadas. Ao acessarmos cada uma delas, a relacionamos com significados que aprendemos sobre as mesmas.
Considerando isso, é interessante perceber que, a depender da época, alguns vocábulos possuíam referências diferentes das quais conhecemos hoje. Por exemplo:
- Depois do almoço ela deita para fazer o quilo.
A expressão “fazer o quilo”, nesse caso, significa “fazer digestão” e esse sentido era e ainda é empregado por pessoas mais idosas.
Ou seja, apenas uma parte restrita dos falantes da sociedade tem acesso a esse significado dentro de seu léxico. Por consequência, seu uso em outras parcelas sociais é vazio de significado.
Da mesma forma, muitos vocábulos eram usados para denominar palavras que hoje possuem outra forma em nosso léxico, como:
- Aeroplano = avião.
Todas essas mudanças acontecem, pois, as línguas estão em constante transformação. Afinal, de acordo com o contexto social, período histórico e geração, a maneira de falar se adapta à necessidade dos falantes.
Por consequência, a comunidade linguística pode deixar de lado um conjunto de propriedades de uma palavra para ativar outro conjunto para o mesmo vocábulo, ou esquecê-lo.
Sendo assim, uma palavra, ou seu significado, morre para que outras surjam.
Para Castilho (2010), a decisão sobre o léxico acontece durante a interação dos falantes. Dessa perspectiva, é através do uso que as propriedades lexicais são ativadas, reativadas ou desativadas.
Dessa forma, o processo não é uma iniciativa individual de um falante, mas um resultado da função primordial da língua que é a comunicação.
Para ilustrar essa situação, vamos pensar em uma conversa hipotética entre um jovem e um idoso:
- Idoso: Meu neto, eu acredito que a derradeira coisa a você fazer no seu dia deve ser a leitura.
- Jovem: Mas, vô, eu gosto de TikTok.
O que podemos perceber nesse diálogo é que não há o estabelecimento da comunicação entre os dois.
Ao contrário, o avô põe sua opinião sobre qual seria a última (derradeira) coisa que o neto deve fazer no dia e o neto diz que ele gosta de uma rede social (TikTok).
Esse conflito geracional acontece porque a palavra “derradeira” teve seu significado esvaziado com o tempo e o nome “TikTok” não faz parte do léxico da geração do avô.
Por outro lado, se o jovem, mesmo não sendo da geração em que a palavra “derradeiro” era comumente usada, mas em casa sempre ouviu a palavra, quando seu avô a usasse, ele saberia o significado.
Da mesma forma, se o avô é alguém que gosta de tecnologia, redes sociais, ele entenderá sobre o que o neto está falando e, assim, até pode entender que o neto prefere “fazer TikTok” ao invés de ler.
Outro contexto muito interessante em que a deslexicalização ocorre é na nomeação de objetos tecnológicos, pois a cada dia há a substituição de equipamentos por outros mais modernos.
Um exemplo clássico desse caso é o “disquete”, que era usado para arquivar documentos e que foi substituído pelo “pen-drive”.
Referências:
PERINI, Mário. A língua do Brasil amanhã (Falaremos portunhol?). In: ___ A língua do Brasil amanhã e outros mistérios. São Paulo: Parábola Editorial, 2004, p.11-24.
CASTILHO, Ataliba T. de. Deslexicalização. In: ___ Nova Gramática do português brasileiro: tradição e ruptura. São Paulo: Contexto, 2010, p.117-121.
Texto originalmente publicado em https://www.infoescola.com/linguistica/deslexicalizacao/
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