A sangria é um método terapêutico onde se retira parte do sangue do paciente com o intuito de curar ou aliviar alguma doença. Têm-se registros da aplicação desse método desde 2.000 a.C. pelos babilônios e sabe-se que seu uso era considerado padrão da medicina até o século XIX. Mas você sabia que a sangria é utilizada até hoje?
Atualmente chamada de flebotomia ou sangria terapêutica ela é usada com muito mais cuidado do que antigamente, mas é tão antiga que encontra-se incorporada às mais diferentes culturas como a indiana onde faz parte da prática ayurvédica, a indígena (principalmente na América do Norte) e a da cultura chinesa, sendo empregada das mais diferentes formas: em algumas culturas eram usadas cabaças recortadas que faziam às vezes de ventosas ou então chifres de animais utilizados da mesma forma e até mesmo sanguessugas.
Hipócrates, no século V a.C., definiu a chamada teoria dos humores e tinha a sangria como forma de cura capaz de balancear os humores desde que usada com cautela, mas já a partir do século I a.C. existem relatos de que ela passara a procedimento comum para a cura de qualquer doença e até mesmo como procedimento periódico em pessoas sadias com o fim de prevenir doenças.
Usado tanto para tratar pessoas quanto para tratar animais o procedimento de sangria podia ser realizado, no homem, com o auxílio de tigelas para colher o sangue retirado através de cortes realizados com o auxílio de lancetas (instrumento cortante com dois gumes), bisturis ou phlebotomos (instrumento mecânico menos usual) quando o alvo eram veias ou artérias, ou de lancetas, ventosas e sanguessugas quando o alvo eram os vasos capilares. No primeiro caso, quando a sangria era feita por meio de incisão em artérias, o procedimento recebia o nome de “arteriotomia”, se a incisão fosse em uma veia, chamava-se “phlebotomia” e se fosse nos vasos capilares chamava-se “sangria capilar” (LANGGAARD, 1895).
No Brasil têm-se notícia do uso terapêutico de sangrias desde o século XVI e sabe-se que sua prática era realizada na maior parte por negros e forros (escravos alforriados) sendo os praticantes identificados como “sangradores” ou mesmo como “barbeiros-sangradores” uma vez que o primeiro podia exercer o ofício do segundo e vice-versa. O ofício trazido de Portugal refletia o que se usava em toda a Europa onde era bastante comum o uso de sanguessugas que podiam ser encontradas à venda em qualquer barbearia ao contrário do que era praticado no oriente onde se fazia uso de ventosas.
No Brasil, como em Portugal, os profissionais tinham que obter a autorização do cirurgião-mor para realizar as sangrias e as mesmas podiam ser realizadas nos estabelecimentos dos profissionais sangradores ou mesmo nas ruas como pode ser constatado em um relato de 1985 (SALGADO, 1998):
“Para as dores reumáticas, eles usam de maneira singular as ventosas, que geralmente são aplicadas por um negro. Um dia, ao passar pela rua detrás do palácio, vi um médico negro aplicando esse tratamento em alguns pacientes sentados na escadaria de uma igreja. Ele amarrou o braço e o ombro de uma mulher que parecia sentir dores terríveis e, fazendo pequenas escarificações em vários pontos com um pedaço de lâmina de navalha, começou a bater levemente nesses locais com a parte plana da lâmina até que o sangue surgisse. Em seguida colocou pequenas ventosas feitas de chifres sobre elas e, aplicando sua boca numa abertura situada na extremidade, habilmente extraiu o ar de seu interior e fechou a abertura com argila, deixando-a firmemente presa à pele. Fazendo a mesma coisa, ele fixou mais sete ventosas do cotovelo ao ombro, onde elas tinham uma aparência muito estranha. Quando foram removidas, o braço estava coberto de sangue e a mulher disse que sentia um grande alívio.”
O problema é que a sangria por vezes ao invés de curar acabava causando a morte de alguns pacientes. Assim, e devido ao avanço da medicina como ciência ela foi deixando de ser utilizada na cultura ocidental embora ainda tenha uma forte presença na cultura chinesa, por exemplo, onde é aplicada até hoje na chamada ventosaterapia e em algumas técnicas de acupuntura. Mesmo assim, no ocidente a flebotomia pode ser utilizada para tratar algumas doenças porém usa-se o mesmo processo que o da retirada para doção de sangue com instrumentos estéreis e bolsas coletoras ao invés das sanguessugas (Ainda bem não é?) só que o sangue retirado não pode ser mais utilizado e é descartado e o procedimento é sempre realizado em hospitais ou hemocentros e com recomendação e acompanhamento médico.
Fontes SALGADO, T. S.: Barbeiros-sangradores e curandeiros no Brasil (1808-28). História, Ciências, Saúde - Manguinhos, vol. V(2): 349-72, jul.-out. 1998. Acessado em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-59701998000200005&script=sci_arttext#not3
LANGGAARD, Theodoro.: Diccionario de Medicina Domestica e Popular. Tomo Terceiro M-Z. Rio de Janeiro, 1865. Tipografia Laemmert. Acessado em: http://books.google.com/books?id=2gAHAAAAcAAJ&hl=pt-BR
http://www.unb.br/fm/hismed/?pagina=acervo http://www.fmrp.usp.br/revista/1999/vol32n3/sangria_terapeutica.pdf http://enfermagemcomentada.blogspot.com/2007/08/flebotomia.html http://www.terapiaschinesas.com.br/2007/07/o-que-sangria-e-tratamento-para.html http://medicosdeportugal.saude.sapo.pt/action/10/glo_id/5442/menu/2/ http://www.medicinachinesapt.com/ventosaterapia.html http://www2.uol.com.br/vyaestelar/med_chin.htm http://super.abril.com.br/superarquivo/2004/conteudo_342833.shtml
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