Quando lidas as poesias de Antero de Quental, tem-se a impressão de que ele é um poeta atual. Elas são entendidas, nos dias de hoje, devido à história de vida do autor (Século XIX).
São características do período anteriano: o sentido dos conceitos de pessimismo, evasão e morte, a importância da liberdade existencial, o âmbito do Pluriverso Anteriano e o significado da “presença” histórica.
A metafísica é uma sub-característica de sua obra, ou seja, aborda a essência das coisas, as primeiras causas, os primeiros princípios. O poeta filosofava na poesia as ideias do homem.
Em meados de 70, utilizava a morte e a existência como tema de suas reflexões e produções literárias. Tinha como preocupação o problema do destino humano e o significado do universo, como Antero confirma: “... Da luta que então combati, durante 5 ou 6 anos, como meu próprio pensamento e o meu próprio sentimento que me arrastavam para um pessimismo vácuo e para o desespero, dão testemunho... muitas poesias.”
Em seus sonetos o autor foge de expressões românticas, o que vai ao encontro das suas aspirações do absoluto. Ele também foi um dramatizador dos problemas da consciência.
Sua filosofia de vida é dividida em quatro ciclos: Lirismo da juventude (1860-1866), A euforia e subsequente pessimismo do apostolado social de Antero (1866-1873), Os desejos de evasão e oblívio e o anseio da morte (1874-1880) e O Pluriverso (1880-1891).
Lirismo da juventude (1860-1866): durante esse período, o poeta não exalta apenas coisas boas, fala de seus fracassos e desilusões. Ele utiliza, em seus poemas, de sonhos amorosos e amores secretos, expressa uma explosão de emoções e convulsões carnais cultuando a figura feminina. Como mostra a estrofe (“Amor Vivo”) a seguir:
“Sim, vivo e quente! e já a luz do dia Não virá dissipá-lo nos meus braços Como névoa da vaga fantasia...”
Porém, Antero não escrevia somente poesias sensuais. Em seus textos encontra-se também o amor puro, sensível e triste. Exemplificando com uma estrofe de “Idílio”:
“Quando nós vamos ambos, de mãos dadas, colher nos vales lírios e boninas, e galgamos dum fôlego as colinas dos rocios da noite inda orvalhadas...”
Em A euforia e subsequente pessimismo do apostolado social de Antero (1866-1873), Antero de Quental é intitulado como iniciador e condutor da literatura portuguesa porque sua obra refletia o choque entre o idealismo filosófico e político e as teorias socialistas. O autor pertencia a esta última classe e nos seus escritos mostrava características socialistas. Além disso, preocupava-se com o drama da decadência de Portugal, interessava-se por política e lançou-se a reforma geral da causa lusíada. Em seus textos menciona causas liberais e socialistas. Antero confessa: “...Queria reformar tudo, eu nem sequer estava ainda a meio caminho da formação de mim mesmo”.
No poema “No Circo” ele refletia a rebeldia contra o tradicionalismo português e a voz do povo e também mostrava o anarquismo da época e a euforia da população em relação aos acontecimentos citados:
“... Senti um monstro em mim nascer nessa hora, E achei-me de improviso feito fera... - É assim que rujo entre leões agora!...”
Mesmo em meio a essas confusões, ele ainda demonstrava confiança no futuro e no progresso da humanidade.
Já em 1870, começa a fase do negativismo e pessimismo, motivado por sua doença. Perdeu sua vida social e sua filosofia estava carregada de pensamentos ruins. Em meados do mesmo ano, rejeitou o anarquismo; ícone de sua contradição.
Tal ciclo chega ao fim devido às incompreensões humanas e tragédia de sua doença.
Os desejos de evasão e oblívio e o anseio da morte (1874-1880): sua doença transformou sua vida numa série de desistências, tanto para o homem de ação como para o filósofo e artista. A partir desses fatores, desprezou a vida social, pois achava que esta corrompia a inteligência e a consciência.
Houve uma contradição de crenças e princípios, e o pessimismo tornou-se seu companheiro. Perdeu a esperança e enxergou a realidade no meio político e social. O futuro não importava, o presente estava destruído. Comprovando por meio de um fragmento da poesia “A J. Félix dos Santos”:
“... Ai! Que importa o futuro, se inclemente Essa hora, em que a esperança nos consiste, Chega... É presente... E só à dor assiste? ... Assim, qual a esperança que não mente? ...”
Passada a fase do pessimismo, encontrou na Virgem Santíssima um refúgio; tinha Ela como figura materna, sendo que antes a considerava um mero símbolo.
Segundo Oliveira Martins “... A visão é a Virgem Santíssima, e a poesia é tão sincera, tão verdadeira, tão cheia de piedade que... um monge cristão escreveria isto. E Antero de Quental nem é cristão, nem crê em Deus, nem na Virgem...”. Indo ao encontro disso, segue uma estrofe da poesia “Mãe”:
“Descuidada, feliz, dócil também, Se eu pudesse dormir sobre o teu seio, Se tu fosses, querida, a minha Mãe.”
Quental encarava a morte como consequência da busca do homem pela perfeição e também como a afirmação do espírito, este buscava alcançar a indiferença. Atingiu o estado de espírito ideal, desprendendo-se do individualismo e sensibilidade e logo chegou ao vácuo, buscando o esquecimento total e existencial.
Essas ideias resultaram na obra “Nirvana”:
“ Para além do Universo luminoso, Cheio de formas, de rumor, de lida, De forças, de desejos e de vida, Abre-se como um vácuo tenebroso."
Conceitos de evasão e morte: seu pessimismo repudiava a si mesmo, a religiosidade e os valores éticos e estéticos.
O poeta percebia em tudo a ação maquiavélica de uma natureza má e depravada. Chorava sua desgraça, amargura, dor, tristeza, via a existência como torturante incerteza. Exemplificação disto é parte da poesia “O Palácio da Ventura”:
“Abrem-se as portas de ouro, com fragor... Mas dentro encontro só, cheio de dor, Silencio e escuridão – e nada mais!”
Já no Pluriverso (1880-1891), período filosófico no qual desenvolveu as mais belas poesias e criou seu pluriverso, no qual o centro é o espírito –engloba todo o universo e os seres em evolução – ou ideia revolucionária – requer que o ser humano conheça a si próprio.
Este novo “mundo” surgiu da exploração de novos horizontes existenciais e novas dimensões da verdade. Sua análise quanto ao pluriverso defendia que o espírito é a incógnita do problema que o atormentava.
Mantinha-se em oposição ao positivismo – banalidade e filosofia deficiente – e ao naturalismo do século XIX. Ambos exageravam na adoração da vida material, deixavam insatisfeitos o sentimento, consciência e espírito.
Segundo Quental, a filosofia que excluía a metafísica – princípio autêntico a vida do espírito filosófico – era confusa. Desprendeu-se da fé e no início da metafísica afirmava que o espírito não tinha consciência da sua existência. No texto “Ignotus” o espírito proclama:
“ – Não vos queixeis, ó filhos da ansiedade, Que eu mesmo, desde toda a eternidade, Também me busco a mim... sem me encontrar!”
O anteriano é dominado pelo egoísmo, instinto e paixões. É na comunidade que ele conhece a si próprio e se depara com outros seres humanos, confrontando situações em que predomina: dor, tédio, morte, ilusão e desengano. Na estrofe a seguir, do poema “Evolução”, o homem debate sua origem:
“Hoje sou homem – e na sombra enorme Vejo, a meus pés, a escada multiforme, Que desce, em espirais, na imensidade.”
Neste ciclo, Antero voltou com o sentimento do “Bem” – momento mais íntimo da evolução do ser humano que o homem deve seguir – o qual em sua fase anterior não era praticado e encontrou explicações para suas dúvidas anteriores.
A partir de suas ideias e obras, Antero de Quental foi nomeado como modernizador e modelo da poesia portuguesa.
O poeta escreveu textos durante toda a sua vida, inclusive na época em que adoeceu. Porém, as diferenças na sua poesia eram gritantes, de acordo com o seu estado de espírito.
Foram temas de seus poemas: o amor puro e carnal, a revolta contra os princípios de Portugal, o desejo de morte, a busca por um estado de espírito ideal, a Virgem Santíssima, o pessimismo, a metafísica e o homem na sociedade.
Toda essa contradição de sentimentos em versos, torna-o um dos grandes poetas da literatura portuguesa, um autor eclético que conseguiu expressar todas essas fases de sua vida em suas obras.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: SILVA, Fernando M. Soares. ANTERO de QUENTAL evolução da sua filosofia existencialista e do seu pensamento pedagógico. 1986. 189 p. MONTEIRO, Adolfo Casais. ANTERO DE QUENTAL poesia e prosa. 4ª ed. Rio de Janeiro: AGIR Editora, 1972. 125p.
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