Para compreender a influência estrangeira no Golpe Militar de 1964 é importante ter em mente o contexto político internacional do período. Desde o fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) emergiam duas superpotências políticas e econômicas globais: a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas e os Estados Unidos da América. Esses países disputavam áreas de influência em todo o mundo, no entanto, não declaravam abertamente o conflito, motivo pelo qual o período ficou conhecido como Guerra Fria. Na América Latina, as disputas entre as duas superpotências se acirrou após Revolução Cubana (1959). O temor estadunidense de que regimes socialistas fossem difundidos pelo continente levou-os a estimularem golpes preventivos das forças políticas de direita de países latino-americanos, assim também ocorreu no Golpe instaurado no Brasil em 1964.
Como observou o historiador Jacob Gorender, o Golpe Militar de 1964 não foi gestado em Washington, foi fruto das ações políticas dos setores conservadores e direitistas brasileiros. No entanto, o historiador asseverou que o imperialismo estadunidense “incentivou e ajudou [o golpe] de várias maneiras” (GORENDER, 2014:57). E ressaltou dentre essas “maneiras” a atuação e influência do embaixador Lincoln Gordon na política brasileira. (Cf. Idem)
Na década de 1960, Lincoln Gordon havia fundado um programa para conter o avanço do socialismo e de revoluções na América Latina: a Aliança para o Progresso. Esse programa foi uma iniciativa do governo presidencial estadunidense de John Kennedy e pretendia estimular o equilíbrio dos orçamentos dos países no continente e, sobretudo, deter o impacto da Revolução Cubana. Ademais, Lincoln Gordon atuou como embaixador no Brasil entre os anos de 1961 e 1966. Além de articular politicamente com agentes que desencadearam o Golpe de 1964, o embaixador Gordon solicitou ao governo estadunidense, em um telegrama secreto, armas de guerra a fim de assegurar a instauração do Regime Militar (Cf. State Department, 1964).
A princípio, Lincoln Gordon não considerava o governo da presidência da República de João Goulart como uma ameaça à influência estadunidense no Brasil. O embaixador estadunidense acreditava que o apoio econômico da Aliança para o Progresso concedido ao Brasil tornaria o presidente da República mais propenso a aceitar a interferência imperialista no país. O crédito do embaixador concedido ao presidente brasileiro foi abreviado devido ao restabelecimento das relações diplomáticas brasileiras com a União Soviética. Outros fatores que dissuadiram Lincoln Gordon foram as pressões políticas de setores de direita e as expropriações realizadas pelo governo de Goulart que afetavam o domínio estadunidense no país. (Cf. RAPOPORT & LAUFER, 2000)
Além da diligência da embaixada estadunidense em fomentar um golpe militar no Brasil, a Central Intelligence Agency (CIA) também financiou e apoiou grupos conservadores empenhados na deposição de João Goulart. As principais organizações financiadas pela CIA foram o Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) e o Instituto Brasileiro para a Ação Democrática (IBAD) que produziam propaganda anticomunista e anti-Goulart. Nas eleições parlamentares de outubro de 1962, recursos estadunidenses foram destinados a candidatos contrários a João Goulart. (Cf. Idem)
Em 1963, o General estadunidense Vernon Walters foi designado agregado militar da Embaixada estadunidense no Brasil. Walters mantinha relações estreitas com o marechal Humberto Castelo Branco e também com outros militares que, como o marechal brasileiro, haviam participado de combates durante a Segunda Guerra Mundial. O general Vernon Walters reforçou o apoio ao golpe militar no Brasil e reconheceu posteriormente que os militares eram considerados como defensores “da ordem e da Constituição” na América Latina, logo, comporiam o setor considerado mais apto à realização de golpes preventivos no continente (Apud. Idem). Devido a essa concepção acerca dos militares, os agentes estadunidenses utilizavam os Programas de Assistência Militar (MAP) como meios de formar política e ideologicamente as Forças Armadas. (Cf. Idem)
Por fim, os Estados Unidos acompanharam o processo do Golpe de 1964 com a "Operação Brother Sam". Essa operação consistiu em apoio bélico no ato do golpe, em 31 de março de 1964. No dia do golpe militar, foram mobilizadas forças navais estadunidenses para o Panamá que se dirigiriam ao Rio de Janeiro caso houvesse empecilhos ao Golpe. A "Operação Brother Sam" foi suspensa, pois não houve resistência no momento do Golpe de 1964 (Cf. Idem). Em 14 de abril de 1964, o marechal Humberto Castelo Branco foi empossado presidente da República e iniciou o Regime Militar no Brasil que perduraria até 1985.
Referências
Brasil. Comissão Nacional da Verdade. Relatório/ Comissão Nacional da Verdade. Vol. 1. Brasília: CNV, 2014. Disponível em: http://cnv.memoriasreveladas.gov.br/images/pdf/relatorio/volume_1_digital.pdf. Acessado em 08 de fevereiro de 2020 às 9h e 53m.
GORENDER, Jacob. Combate nas Trevas. São Paulo: Fundação Perseu Abramo/Expressão Popular, 2014.
State Department, Top Secret Cable from Amb. Lincoln Gordon, March 29, 1964. Disponível em: https://nsarchive2.gwu.edu//NSAEBB/NSAEBB118/bz05.pdf Acessado em 9 de maio de 2020 às 11h e 22m.
RAPOPORT, Mario & LAUFER, Rubén. “Os Estados Unidos diante do Brasil e da Argentina: os golpes militares da década de 1960”. Revista Brasileira de Política Internacional. vol.43 n°.1 Brasília Jan. 2000. Disponível em https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0034-73292000000100004&script=sci_arttext Acessado em 9 de maio de 2020 às 18h e 33m.
Texto originalmente publicado em https://www.infoescola.com/historia/influencia-estrangeira-no-golpe-militar-de-1964/
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