Roedores sinantrópicos comensais são animais que adentraram e se adaptaram ao ambiente da população humana (cidade ou campo), onde encontraram suprimento alimentar para manterem suas colônias. No entanto, essa relação causa prejuízos econômicos e principalmente sanitários, pois esses animais estão envolvidos na cadeia epidemiológica de inúmeras zoonoses como leptospirose, hantavirose e listeriose.
Dentre os fatores que contribuíram para o surgimento dessa relação, pode-se citar o crescimento populacional, juntamente com a globalização, que promoveu o aumento na demanda, produção e estocagem de alimentos, e também as infraestruturas de saneamento básico precárias, que facilitaram o ingresso dos roedores no interior das casas. Os principais representantes desse grupo são: o Rattus norvegicus (ratazana), Rattus rattus (rato de telhado) e Mus musculus (camundongo) e a característica que os une é a ocorrência de dentes incisivos de crescimento contínuo.
O processo de controle desses roedores é necessário, porém ele deve ser feito de forma racional e estruturada, para não gerar um desequilíbrio ambiental ou até mesmo intoxicações e mortes tanto de seres humanos, quanto de animais de companhia. O desvio do uso de alguns defensivos agrícolas, para o combate aos roedores (rodenticida), é compreendido como crime contra saúde pública e passível de punição penal. De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), o aldicarbe, conhecido popularmente como "chumbinho" é o fitossanitário mais utilizado clandestinamente, porém o carbofurano, o metonil e o forato também são comercializados de forma ilegal.
O aldicarbe (C7H14N2O2S) é um composto orgânico tóxico, pertencente ao grupo químico dos carbamatos. Sua absorção pelo organismo pode ocorrer por meio das vias aérea, oral e cutânea e sua toxicidade provém da inibição reversível da acetilcolinesterase. A acetilcolina é um mediador químico responsável pela transmissão do impulso nervoso, mas sua ação precisa ser interceptada pela AChE, pois caso contrário, ela ficará ativa por um maior tempo na fenda sináptica e produzirá os efeitos da superestimulação colinérgica.
As manifestações clínicas da intoxicação por chumbinho variam conforme a quantidade e o tempo de exposição ao composto, entretanto os sinais se iniciam em menos de 1 hora após o contato. Os indivíduos acometidos podem apresentar êmese, diarreia, dor abdominal, bradicardia, miose, hiperglicemia, hipertensão, depressão respiratória, fraqueza muscular e paralisia. A morte pode ocorrer por parada respiratória devido a hipertonicidade dos músculos respiratórios. Os achados post mortem mostram que as consequências da estimulação excessiva dos receptores nicotínicos e muscarínicos provocam lesões de caráter congestivo e hemorrágico; a degeneração hidrópica pode ser vista principalmente nos pulmões e no fígado.
É importante conhecer os sinais decorrentes dessa intoxicação para se tomar as providências cabíveis em tempo hábil. A lavagem gástrica e a administração de carvão ativado são protocolos genéricos e eficazes, ademais a medida específica para reverter o quadro é o uso do sulfato de atropina, em doses suficientes para estabilizar os sinais muscarínicos.
As intoxicações em geral podem ocorrer de forma acidental, intencional ou criminosa, mas se relacionam com a facilidade de acesso ao composto. No Brasil, a notificação dos casos de intoxicação por defensivos agrícolas é compulsória desde 2004, contudo as medidas preventivas para se eliminar ou minimizar os riscos de ocorrência precisam de maior atenção.
É necessário uma maior divulgação sobre a forma correta do manejo integrado de roedores, demonstrando suas características biológicas e comportamentais. Deve-se enfatizar a tríade existente para se ter o sucesso esperado, o qual envolve medidas preventivas, medidas corretivas e por último o controle químico (rodenticida), utilizado somente quando as duas primeiras foram falhas.
É importante também conscientizar a população para a utilização apenas de rodenticidas aprovados pelo governo, pois eles apresentam rotulagem diferenciada, com todas as especificações necessárias, como por exemplo: frases e figuras adversativas, precauções obrigatórias e informações precisas para o uso médico em casos de incidentes.
Referências:
FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE. Manual de controle de roedores. Brasília: Ministério da Saúde, Fundação Nacional de Saúde, p.129. 2002.
ARAÚJO, L. A. et al. Intoxicação por aldicarb (chumbinho) em um felino – Relato de caso . IN: Trabalho apresentado no II Simpósio de Pequenos Animais. Ciência Animal 27(2), 2017.
BRASIL. Resolução ANVISA RDC nº 174 DE 8 DE JULHO DE 2003. Dispõe sobre Rotulagem de Produtos Desinfestantes Domissanitários.
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