A Lei Eusébio de Queirós foi aprovada em 4 de setembro de 1850, durante o segundo reinado do império brasileiro. Sua aprovação é bastante significativa para o contexto do século XIX no Brasil. Esta lei teve por principal objetivo proibir o tráfico atlântico de escravos, vindos do continente africano ao Brasil – um fenômeno chamado de Diáspora Africana.
D. Pedro II assume o reinado em 1840, após o Golpe da maioridade, e precisou lidar com diversas questões, dentre elas o tráfico de escravos que, desde esse período já causa tensões nas relações entre Brasil e Inglaterra.
O papel da Inglaterra é fundamental na determinação do fim do tráfico atlântico. Pressionou o Brasil de variadas formas, dentre elas com inspeções rigorosas em alto-mar, chegando a apreender navios suspeitos de comércio ilegal.
O Estado imperial brasileiro, mesmo compactuando com o tráfico atlântico e com um mercado interno ainda muito dependente dele, entendia os limites deste tipo de atuação. Ao mesmo tempo que via o tráfico como elemento fundamental na manutenção da mão de obra escrava, especialmente nas fazendas de café, percebia o quão insustentável seria politicamente a continuidade desta estrutura. A interdição, portanto, era fundamental para legitimar a autonomia política da recente nação.
Além disso a manutenção do tráfico colocava o Brasil no lugar das nações consideradas “não civilizadas”, ou seja, o oposto do desejo nacional de se inserir no ideal de modernidade e civilização do século XIX. É preciso destacar que houve, já em 1831, uma lei que previa penas aos traficantes de escravos e que colocava livres todos que entrassem no país a partir de então. Essa lei, segundo Boris Fausto, foi considerada uma lei “para inglês ver”, pois não foi efetivamente colocada em prática. Neste contexto parte do Ministro da Justiça, Eusébio de Queirós, um projeto de lei para que fossem tomadas medidas mais contundentes contra o tráfico atlântico.
Eusébio de Queirós nasceu em Angola, no continente africano. Filho de um juiz luso angolano, fez parte dos quadros do Partido Conservador e esteve à frente da lei que proibiu o tráfico atlântico. Há neste contexto uma defesa do fim do tráfico por parte do Partido Conservador. Para os conservadores a decisão de findar o tráfico atlântico deveria partir da nação brasileira, para que assim a imagem da soberania nacional fosse preservada, sem interferências inglesas.
Para além da aprovação da lei, a pressão inglesa foi importante para que ela fosse de fato seguida. Os proprietários – de terras e de escravos – dependiam do tráfico, pois, segundo Boris Fausto, pouco se preocupavam com a sua reprodução. O mercado interno de escravos era sustentado muito mais pelo tráfico que pela sua reprodução em terras brasileiras. Desta forma em poucos anos o número de cativos seria insuficiente para o trabalho nas fazendas – especialmente as de café.
Se em pouco tempo o número de cativos seria escasso e se o fim do tráfico estava a partir de 1850 garantido por lei, colocava em cheque a manutenção da escravidão no país e o sistema escravagista que, aos poucos, perdia legitimidade.
O impacto do fim do tráfico atlântico no Brasil é evidente. A partir de então verbas excedentes passam a ser utilizadas na própria estrutura interna, como abordam Lilia Schwarcz e Heloisa Starling:
“Assim, encerrado o tráfico, uma massa de recursos surgiu da noite para o dia, como num passe de mágica, A saída para o Estado foi investir na infraestrutura do país, e acima de tudo na área dos transportes ferroviários. Para dar uma ideia, de 1854 a 1858 foram construídas as primeiras linhas telegráficas e de navegação e as primeiras estradas de ferro, a iluminação a gás chegou às cidades, e o número de escolas e de estabelecimentos de instrução começou a crescer.”
Mesmo com todos investimentos em infraestrutura acima citados a questão do tráfico continuava a ser uma tensão no país. Com o fim do comércio atlântico de sujeitos escravizados houve um aumento do tráfico interno, notadamente concentrado nas regiões do Rio de Janeiro e São Paulo, onde estavam presentes as maiores lavouras de café – o principal produto produzido no país.
Referências bibliográficas:
FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2007.
SCHWARCZ, Lilia & STARLING, Heloisa. Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.
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