Parnasianismo é uma estética literária do século XIX, contemporânea ao Realismo e ao Naturalismo. Trata-se de uma estética em reação ao sentimentalismo idealizante do romantismo. Em 1871 foi publicado o Parnasse Contemporain, donde surgiu o nome parnasianismo. A publicação contava com escritores de estilos bastante diversos, indo do simples “malabarismo formal (...) ao realismo miúdo da vida cotidiana, passando pela alegoria filosófica e pela poesia histórica e descritiva” ¹. Havia uma tendência em observar o mundo objetivamente, detendo-se em objetos e cenas, abolindo quase totalmente a subjetividade e emotividade do romantismo. Era preciso um rigor formal por meio do verso bem trabalhado com rimas bem elaboradas e raras, ritmo bem marcado (métrica do verso) e um vocabulário raro e preciso, “de efeitos plásticos e sonoros capazes de impressionar os sentidos”¹.
Inspirado no poeta francês Pierre Jules Théophile Gautier e na poesia do realista Charles Baudelaire, o parnasianismo repete o mesmo gosto pelo ideal positivista e pela objetividade da ciência. Gautier defendia que a palavra deveria ser objeto do poema. A beleza poesia deveria ser alcançada por um trabalho obstinado, incansável, que buscasse o rigor da forma, descartando a inspiração. Desse ideal nasce a teoria da “arte pela arte”. Assim, a poesia se torna descritiva com poucas figuras de linguagem, com verso rebuscado comparado à joia lapidada.
Maio (François Coppée - tradução de Raimundo Correia)
Há um mês foste-te embora; E eu sofro de ti distante, Embalde viceja agora O lilás fresco e odorante.
A sós, fujo ao claro brilho Deste céu que me exaspera, Pois aumenta o horror do exílio O esplendor da primavera.
Contra os vidros transparentes Da alcova de onde não saio, Batendo as asas trementes Ouço os insectos de Maio.
Do sol ao rútilo beijo Cerro os lábios, desgostoso, E só, do lilás desejo O húmido ramo cheiroso;
Pois em meio às suas dores, Do lilás, minh'alma em ânsia, Vê teus olhares — nas flores, Teu hálito — na fragrância.
Em Portugal, o parnasianismo não apresentou muita representatividade. Alguns poemas de Antero de Quental poderiam enquadrar-se na estética parnasiano, entretanto a grande parte da obra do autor é realista. No Brasil, o parnasianismo teve mais representatividade como nomes como Olavo Bilac e Alberto de Oliveira e Raimundo Correia. Segundo Castello apenas no Brasil e na França houve um movimento parnasiano que se destacasse.
Seguindo o exemplo francês, o parnasianismo brasileiro defende a “arte pela arte” e segue as mesmas características.
Olavo Bilac foi o mais reconhecido nome da poesia parnasiana brasileira. Inspirando-se nos mestres franceses, compôs verdadeiras obras primas como o poema Via láctea. Esse poema faz parte do livro Poesias publicado uma primeira vez 1888, reeditado em 1902 (quando acrescenta Via láctea) e uma terceira vez em 1921. Da obra, o poema XIII tornou-se talvez o mais conhecido.
XIII - Olavo Bilac
"Ora (direis) ouvir estrelas! Certo, Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto, Que, para ouvi-las, muitas vezes desperto E abro as janelas, pálido de espanto...
E conversamos toda a noite, enquanto a Via-Láctea, como um pálio aberto, Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto, Inda as procuro pelo céu deserto.
Direis agora: "Tresloucado amigo! Que conversas com elas? Que sentido Tem o que dizem, quando estão contigo? "
E eu vos direi: "Amai para entendê-las! Pois só quem ama pode ter ouvido Capaz de ouvir e e de entender estrelas"
Nesses versos, o poeta trata de amor de maneira descritiva e narrativa. Não há aprofundamento sentimental apesar do evidente lirismo. O rigor formal é evidenciado pela rima artificial estrelas/vê-las (rima preciosa).
Outro poema significativo do poeta é Profissão de fé. Nesse poema, vemos uma das influências do poeta, Victor Hugo (realista francês). Nesse poema, Bilac trata do ofício do poeta a quem compara ao ourives.
Profissão de Fé - Olavo Bilac
Le poète est cise1eur, Le ciseleur est poète. Victor Hugo.
Não quero o Zeus Capitolino Hercúleo e belo, Talhar no mármore divino Com o camartelo.
Que outro - não eu! - a pedra corte Para, brutal, Erguer de Atene o altivo porte Descomunal.
Mais que esse vulto extraordinário, Que assombra a vista, Seduz-me um leve relicário De fino artista.
Invejo o ourives quando escrevo: Imito o amor Com que ele, em ouro, o alto relevo Faz de uma flor.
Imito-o. E, pois, nem de Carrara A pedra firo: O alvo cristal, a pedra rara, O ônix prefiro.
Por isso, corre, por servir-me, Sobre o papel A pena, como em prata firme Corre o cinzel.
Corre; desenha, enfeita a imagem, A idéia veste: Cinge-lhe ao corpo a ampla roupagem Azul-celeste.
Torce, aprimora, alteia, lima A frase; e, enfim, No verso de ouro engasta a rima, Como um rubim.
Quero que a estrofe cristalina, Dobrada ao jeito Do ourives, saia da oficina Sem um defeito:
E que o lavor do verso, acaso, Por tão subtil, Possa o lavor lembrar de um vaso De Becerril.
E horas sem conto passo, mudo, O olhar atento, A trabalhar, longe de tudo O pensamento.
Porque o escrever - tanta perícia, Tanta requer, Que oficio tal... nem há notícia De outro qualquer.
Assim procedo. Minha pena Segue esta norma, Por te servir, Deusa serena, Serena Forma!
Deusa! A onda vil, que se avoluma De um torvo mar, Deixa-a crescer; e o lodo e a espuma Deixa-a rolar!
Blasfemo> em grita surda e horrendo Ímpeto, o bando Venha dos bárbaros crescendo, Vociferando...
Deixa-o: que venha e uivando passe - Bando feroz! Não se te mude a cor da face E o tom da voz!
Olha-os somente, armada e pronta, Radiante e bela: E, ao braço o escudo> a raiva afronta Dessa procela!
Este que à frente vem, e o todo Possui minaz De um vândalo ou de um visigodo, Cruel e audaz;
Este, que, de entre os mais, o vulto Ferrenho alteia, E, em jato, expele o amargo insulto Que te enlameia:
É em vão que as forças cansa, e â luta Se atira; é em vão Que brande no ar a maça bruta A bruta mão.
Não morrerás, Deusa sublime! Do trono egrégio Assistirás intacta ao crime Do sacrilégio.
E, se morreres por ventura, Possa eu morrer Contigo, e a mesma noite escura Nos envolver!
Ah! ver por terra, profanada, A ara partida E a Arte imortal aos pés calcada, Prostituída!...
Ver derribar do eterno sólio O Belo, e o som Ouvir da queda do Acropólio, Do Partenon!...
Sem sacerdote, a Crença morta Sentir, e o susto Ver, e o extermínio, entrando a porta Do templo augusto!...
Ver esta língua, que cultivo, Sem ouropéis, Mirrada ao hálito nocivo Dos infiéis!...
Não! Morra tudo que me é caro, Fique eu sozinho! Que não encontre um só amparo Em meu caminho!
Que a minha dor nem a um amigo Inspire dó... Mas, ah! que eu fique só contigo, Contigo só!
Vive! que eu viverei servindo Teu culto, e, obscuro, Tuas custódias esculpindo No ouro mais puro.
Celebrarei o teu oficio No altar: porém, Se inda é pequeno o sacrifício, Morra eu também!
Caia eu também, sem esperança, Porém tranqüilo, Inda, ao cair, vibrando a lança, Em prol do Estilo!
Outro nome importante foi Alberto de Oliveira. Sua poesia era mais narrativa e descritiva servindo como ícone por ser exemplo do rigor formal do período.
Vaso Chinês - Alberto de Oliveira
Estranho mimo aquele vaso! Vi-o, Casualmente, uma vez, de um perfumado Contador sobre o mármor luzidio, Entre um leque e o começo de um bordado.
Fino artista chinês, enamorado, Nele pusera o coração doentio Em rubras flores de um sutil lavrado, Na tinta ardente, de um calor sombrio.
Mas, talvez por contraste à desventura, Quem o sabe?... de um velho mandarim Também lá estava a singular figura.
Que arte em pintá-la! A gente acaso vendo-a, Sentia um não sei quê com aquele chim De olhos cortados à feição de amêndoa.
No poema Vaso Chinês, o poeta trata de maneira narrativa e descritiva o sentimento.
Outro nome importante é o de Raimundo Correia. O poeta autor de As pombas, assim como Alberto de Oliveira, traz uma poesia altamente descritiva.
As pombas - Raimundo Correia
Vai-se a primeira pomba despertada... Vai-se outra mais... mais outra... enfim dezenas De pombas vão-se dos pombais, apenas Raia sanguínea e fresca a madrugada...
E à tarde, quando a rígida nortada Sopra, aos pombais de novo elas, serenas, Ruflando as asas, sacudindo as penas, Voltam todas em bando e em revoada...
Também dos corações onde abotoam, Os sonhos, um por um, céleres voam, Como voam as pombas dos pombais;
No azul da adolescência as asas soltam, Fogem... Mas aos pombais as pombas voltam, E eles aos corações não voltam mais...
Uma curiosidade: Machado de Assis, grande romancista realista também produziu poesia parnasiana, apesar de não ter sido esse gênero que o consagrou, sua produção também encontra destaque.
Flor da Mocidade - Machado de Assis
Eu conheço a mais bela flor; És tu, rosa da mocidade, Nascida, aberta para o amor. Eu conheço a mais bela flor. Tem do céu a serena cor, E o perfume da virgindade. Eu conheço a mais bela flor, És tu, rosa da mocidade.
Vive às vezes na solidão, Coma filha da brisa agreste. Teme acaso indiscreta mão; Vive às vezes na solidão. Poupa a raiva do furacão Suas folhas de azul celeste. Vive às vezes na solidão, Como filha da brisa agreste.
Colhe-se antes que venha o mal, Colhe-se antes que chegue o inverno; Que a flor morta já nada val. Colhe-se antes que venha o mal. Quando a terra é mais jovial Todo o bem nos parece eterno. Colhe-se antes que venha o mal, Colhe-se antes que chegue o inverno.
Fonte:
BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira. São Paulo, Cultrix, 2012.
CASTELLO, Jose Alderado. Presença da Literatura brasileira: Do Romantismo ao simbolismo. Rio de Janeiro, Difel, 1978, pp 99-23.
CANDIDO, Antonio. Formação da Literatura Brasileira. Rio de Janeiro, Ouro sobre azul, 2007, pp. 25-7.
RAMOS, Silva. Poesia parnasiana. São Paulo, Editora Melhoramentos, 1967.
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